Calcula-se centenas de milhares os mortos e em quase onze milhões os desalojados

A grande incerteza sobre os números do conflito

 A grande incerteza sobre os números do conflito  POR-047
21 novembro 2024

Por detrás dos mil dias decorridos desde o início da guerra na Ucrânia, escondem-se muitos números, capazes de ditar o tempo e de dilacerar o espaço em que se desenrola um conflito, capazes de destruir vidas e de despedaçar sonhos. São números muitas vezes ocultos, pois a guerra também se trava com a informação. Em primeiro lugar, há o número mais difícil de se calcular, porque é o mais escondido: o das vítimas. Em setembro, «The Wall Street Journal», citando fontes dos serviços secretos, escreveu que cerca de um milhão de ucranianos e russos foram mortos ou feridos desde 24 de fevereiro de 2022. A maioria são soldados de ambos os lados, seguidos de civis ucranianos. No mesmo mês, a bbc e o portal independente Mediazona localizaram os obituários de 70.000 combatentes russos mortos na Ucrânia — 20% eram voluntários. Os números fornecidos pelo «The Wall Street Journal» parecem estar de acordo com o que o «The New York Times» tinha afirmado um ano antes — em agosto de 2023 — que a guerra tinha causado cerca de 500.000 até àquela data.

Por outro lado, um número sobre o qual existe consenso, graças sobretudo ao papel da agência da onu para os refugiados ( acnur ), diz respeito às pessoas deslocadas: 6,7 milhões de ucranianos procuraram refúgio fora do país, enquanto os deslocados internos são quase 4 milhões. Se pensarmos que, em agosto, um único ataque causou a morte de 184 civis e feriu 856, compreendemos que a fuga pode ser a única solução para estas pessoas.

Até porque as infraestruturas não estão isentas das operações militares. Os bombardeamentos danificaram 3.798 escolas e, destas, 356 foram destruídas. Em mais de dois anos, 1.619 instalações de saúde foram danificadas e outras 214 arrasadas - entre as mais atingidas, as do distrito de Kharkiv, Donetsk, Mykolaiv, Kyiv, Kherson e Zaporizhzhia.

A guerra já atingiu 20% das áreas protegidas da Ucrânia, onde o exército russo ocupou oito reservas naturais e dez parques nacionais. A detonação de bombas, mísseis e outros explosivos impede o crescimento das plantas em cerca de 5 a 10%. Também a qualidade do ar não é poupada por atividades como a utilização de veículos, aviões, drones e combustíveis fósseis, que aumentam as emissões de gases com efeito de estufa e de poluentes como o amoníaco, o monóxido de carbono, o dióxido de enxofre e os óxidos de azoto.

Tudo isto incide sobre a economia nacional ucraniana, que historicamente se baseia na agricultura. Até há poucos anos considerada o «celeiro do mundo», porque exportava 20% do trigo e 45% do óleo de girassol para todo o mundo, atualmente Kyiv — em parte devido aos bombardeamentos dos portos do Mar Negro — perdeu quase toda a sua força comercial. E os efeitos sobre os preços dos géneros alimentícios foram consideráveis, fomentando a inflação na Europa e minando as cadeias alimentares nos países africanos. Além disso, devido à falta de eletricidade, a Ucrânia começou a desmantelar as suas centrais térmicas para obter peças para reparar outras centrais.

E a economia nacional está a sofrer com isto. Em setembro, a inflação subiu para 8,6% (+1,5% em termos mensais) devido ao aumento dos preços dos produtos alimentares, ao aumento das despesas de produção e à pressão contínua da desvalorização da moeda nacional. Embora o país esteja a ficar despovoado, a taxa de desemprego em outubro manteve-se acima dos 15% e o indicador de pobreza — ou seja, as pessoas obrigadas a poupar nos alimentos — nos 20%. Apesar disso, as receitas do orçamento de Estado ucraniano foram utilizadas para financiar a defesa. As despesas civis, por outro lado, foram cobertas pela ajuda externa.

Números por detrás dos quais se escondem histórias, histórias por detrás das quais se escondem pessoas, que contam a trágica humanidade do ato mais desumano que pode existir, a guerra.

Guglielmo Gallone