A propósito do Global Solidarity Fund na Etiópia

Um futuro diferente para deslocados e migrantes

 A propósito do Global Solidarity Fund na Etiópia  POR-050
14 dezembro 2023

Mulheres e homens deslocados ou migrantes de toda a Etiópia, repatriados após emigrarem, refugiados de outros países e pessoas vulneráveis são os beneficiários do projeto-piloto lançado no final de 2020 em Adis Abeba pelo Global Solidarity Fund, em colaboração com congregações religiosas femininas e masculinas. O projeto visa trabalhar em conjunto com empresas privadas, instituições e organizações internacionais para fortalecer o compromisso das congregações em melhorar a vida das pessoas vulneráveis.

O problema dos repatriados é bastante recente: são etíopes que emigraram para terras iemenitas e retornam por causa do conflito no país árabe, mas acima de tudo etíopes forçados a retornar dos países árabes do Golfo, com a Arábia Saudita na liderança, por causa das medidas governamentais contra migrantes irregulares.

Quase todos retornam sem nada. O governo etíope dá-lhes uma pequena quantia em dinheiro para voltar para casa, mas muitos permanecem na capital Adis Abeba. Assim, unem-se aos muitos deslocados internos que se mudam das áreas rurais para melhorar de vida e encontrar trabalho. Há também as crianças de rua: mais de 60 mil em Adis Abeba, que chegam à cidade vindas de todas as partes do país, dormem em bueiros ou embaixo de pontes, roubam comida, cheiram cola e, às vezes, são forçadas a prostituir-se para sobreviver.

O padre Petros Berga, responsável da Comissão sociopastoral da arquidiocese de Adis Abeba, que coordena o projeto Gsf, e visitante apostólico para os católicos etíopes na Europa, conta que no aeroporto, a três km do do Centro de formação São Miguel, onde o encontro, chegam pessoas que foram expulsas da Arábia Saudita e passaram dois anos na prisão por comprar comida no Iémen, uma zona de guerra. «Chegam traumatizadas», diz, e assim «acolhemos o maior número possível delas e procuramos dar-lhes uma vida por meio da formação».

Entre os deslocados da zona rural da Etiópia ou do Tigray, onde um violento conflito local durou até novembro de 2022, há muitas jovens, com idades entre 18 e 25 anos, muitas vezes com gravidez indesejada já no sétimo ou oitavo mês, acolhidas pelas Missionárias da Caridade de Santa Teresa de Calcutá, que oferecem assistência gratuita ao parto. Na Casa da Caridade em Adis Abeba, onde dão à luz, elas permanecem por três meses, e as missionárias aconselham as jovens sobre o modo como cuidar das crianças.

Algumas não querem ficar com os seus recém-nascidos, mas as religiosas de madre Teresa tentam acompanhá-las em um caminho de conscientização e preparação para a maternidade que quase sempre leva as jovens a aceitar a gravidez inesperada. As religiosas e os assistentes sociais tentam, então, entender os seus interesses e talentos, encaminhando-as para dois centros, criados graças ao projeto intercongregacional do Gsf, onde elas vivem, com as suas crianças, durante o período de formação.

Dependendo dos seus interesses, frequentam cursos de design de moda, culinária, assistência doméstica e informática no  Mary Help College das irmãs salesianas, as Filhas de Maria Auxiliadora; de trabalho com couro, fabricação de móveis ou design gráfico com os salesianos no  Don Bosco Children Center;  ou de produção de roupas no  Sitam College das Irmãs Ursulinas. As 38 jovens mães acolhidas no Nigat Center das Missionárias da Caridade com os filhos «estão, na sua maioria, matriculadas no curso de design de moda do  Mary Help College», explica  Girma Anto Muane, responsável pelo projeto do Gsf para as missionárias, «e quando estão em aula, somos nós que cuidamos dos filhos».

Graças à formação recebida, elas logo encontrarão trabalho nas pequenas empresas de vestuário de Adis Abeba, que precisam muito de mão de obra qualificada. O problema é encontrar moradia, pois viver em casa alugada geralmente custa muito em comparação com os salários recebidos. «Ajudamos a encontrar casa para três ou quatro juntas», diz Muane, «dando-lhes alguma ajuda para viver numa casa alugada».

Sememu Hibistu, migrante interna de Debra Marcos, 300 km a noroeste de Adis Abeba, protagonista do vídeo, encontrou alojamento com outras funcionárias perto da empresa onde trabalha. Porque cada movimento é mais difícil para ela, que perdeu uma perna devido a uma infeção quando tinha apenas 11 anos de idade. Derartu Karle, que vem de Metu, Oromia, 500 km a sudoeste da capital, é formada em Gestão do turismo, procurou ajuda das Irmãs de Madre Teresa depois de ser violentada e engravidar. Este ano, ela obteve a certificação em informática da Cisco após um curso no  Mary Help College;  trabalha como codificadora de dados em uma escola de beleza em Lewi há pouco tempo e mora no  Nigat Center com a filha pequena. Endashaw Tesfaye, a terceira voz no vídeo, vinda do sul da Etiópia, ou seja, de Sodo, em Wolayta, para Adis Abeba em busca de trabalho, graças às Missionárias da Caridade e ao projeto do Gsf, estudou soldagem no  Mekkanissa Center dos salesianos de Dom Bosco e agora é supervisor em um laboratório. Vive sozinho, faz malabarismos para pagar a locação da casa, mas olha para o futuro com confiança.

O outro centro de formação dos religiosos salesianos inserido na rede intercongregacional é o Don Bosco Children Center, que acolhe migrantes, pessoas deslocadas internamente e crianças de rua, recolhidas quase todas as manhãs pelo padre Angelo Regazzo, tesoureiro da comunidade salesiana e envolvido no programa de primeiro apoio «Come and see». «Os migrantes e as crianças não têm dinheiro para ir à escola nem para se formar», conta o padre Yohannes Menghistu, diretor da comunidade salesiana. «Aqui eles podem estudar da manhã até às três da tarde. Antes, porém, só podíamos dar-lhes um certificado e ajudá-los a procurar um emprego; hoje, graças ao projeto do Gsf, eles têm muito mais oportunidades de emprego em empresas e também podem ser ajudados a abrir seu próprio negócio».

No consórcio das cinco congregações, o Serviço dos jesuítas aos refugiados ( jrs ) é responsável pela formação empresarial. Mas o jrs também se encarrega, em primeiro lugar, do acolhimento dos que vêm dos campos de refugiados nos subúrbios de Adis Abeba, para o seu centro no coração da capital, onde encontramos  Alemu Nisrane, gerente de projetos do Gsf para o jrs . «Aqui os refugiados encontram atendimento médico de emergência, sustento, atividades recreativas, formação inicial e cursos informais de inglês, informática, música», explica, «e depois oferecemos a possibilidade de se matricularem em formação vocacional administrado por outros membros do consórcio, como o  Mary Help College  das irmãs salesianas, os centros  Don Bosco  e  Mekkanissa  e o  Sitam  das Ursulinas». A formação empresarial e o trabalho independente são administrados pelo jrs .

O projeto-piloto, na esperança do consórcio, deve agora transformar-se em um projeto definitivo e estruturado «para que possamos ajudar as pessoas que nos procuram de forma muito sistemática», diz o padre Petros Berga. Eles pensam em «um único ponto de coordenação para todos os que nos procuram», um centro de acolhimento, para que os migrantes que nos procuram possam saber, passo a passo, o que é necessário para passar pelo processo de formação.

O lugar para a sede deste centro de acolhimento está também em fase de preparação, em um terreno a poucos metros do arcebispado católico de Adis Abeba e da catedral da Natividade da Bem-Aventurada Virgem Maria. Ele ficará em um centro de formação dedicado a São João Paulo ii e também abrigará novos cursos de produção multimídia, instalação de painéis solares, atendimento domiciliar e enfermagem.

Alessandro Di Bussolo
de Adis Abeba


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