· Cidade do Vaticano ·

O arcebispo Vincenzo Paglia fala da posição da Igreja sobre as questões do fim da vida

Não absoluto à eutanásia e ao suicídio assistido

 Não absoluto à eutanásia  e ao suicídio assistido  POR-034
22 agosto 2024

Contrariedade absoluta ao suicídio assistido e à eutanásia; defesa do direito à vida, especialmente para os mais frágeis; uma avaliação necessária dos tratamentos não proporcionais; maior cuidado com os doentes; colaboração entre a Igreja e a política nas questões sobre o fim da vida. O arcebispo Vincenzo Paglia, presidente da Pontifícia Academia para a vida, esclareceu alguns pontos no Pequeno léxico sobre o fim da vida, glossário de 88 páginas publicado pela Libreria editrice vaticana (Lev) sobre as questões altamente éticas relacionadas com o debate sobre o fim da vida: da eutanásia e do suicídio assistido aos cuidados paliativos e à cremação. Publicado no início de julho, o opúsculo voltou à ribalta nos últimos dias, depois de alguns jornais terem destacado o que dizem ser “aberturas” por parte da Santa Sé. Na realidade, explicou o arcebispo Paglia aos meios de comunicação do Vaticano, trata-se de indicações que têm as suas raízes nos últimos setenta anos do Magistério dos Papas e da Igreja. O arcebispo entregou uma cópia do Lexicon ao Papa Francisco na manhã de 8 de agosto, recebendo-o em audiência no Palácio Apostólico.

D. Paglia, encontrou-se com o Papa e entregou-lhe o «Pequeno Léxico sobre o fim da vida». O que disse sobre isto Francisco, que sempre insistiu na defesa da vida em todas as fases do seu desenvolvimento?

O Papa Francisco reiterou o seu apreço pelo trabalho desenvolvido pela Pontifícia Academia para a vida. É certo que o tema do fim da vida é complexo e a Igreja é detentora de um rico magistério, desde Pio xii até hoje. A vida deve ser defendida ao longo de toda a existência e não apenas em alguns momentos particulares. Acima de tudo, há que defender o direito à vida e, em particular, a vida das pessoas débeis, para contrastar a “cultura do descarte” que se esconde por detrás da pretensão de autossuficiência e de autonomia das mulheres e dos homens de hoje.

Há quem diga que este vademecum representa uma abertura da Santa Sé à suspensão da alimentação e da hidratação. É assim?

Recordo que já em 1957 Pio xii — como consta no Léxico — afirmava a legalidade da suspensão da ventilação se estivessem presentes certas condições graves. E já em 2007 a então Congregação [hoje Dicastério, ndr] para a doutrina da fé, depois de afirmar um pressuposto positivo para o seu uso, reconheceu que podem ser legalmente interrompidos (ou não iniciados) quando implicam «excessiva gravidade ou desconforto físico significativo». Estes são dois critérios que fazem parte da definição de tratamento não proporcional, ou seja, aquele que deve ser interrompido. Trata-se de uma avaliação que exige sempre, na medida do possível, a participação da pessoa doente. O Léxico deve ser lido na sua totalidade.

Muda alguma coisa em relação à eutanásia e ao suicídio assistido? Alguns jornais, a propósito do «Pequeno léxico sobre o fim da vida», afirmaram que a rejeição da obstinação terapêutica ou a recusa de uma obstinação irrazoável no tratamento esconde, de facto, um juízo favorável sobre a matéria...

A Igreja reitera a sua contrariedade absoluta a qualquer forma de eutanásia e de suicídio assistido. E é inclusive a minha convicção, mesmo que alguns queiram que eu diga o contrário. Mas a Igreja convida-nos também a refletir sobre o facto de a obstinação irracional (obstinação terapêutica) não ser uma expressão de medicina e de cuidados verdadeiramente adequados e a favor da pessoa doente. A morte é, infelizmente, uma dimensão da vida. É inevitável. É claro que nunca devemos encurtar a duração da vida, mas também não devemos insistir em obstruir o seu curso de forma alguma. Somos frágeis. E é por isso que temos de cuidar uns dos outros. Temos de fazer muito mais do que o habitual para acompanhar as pessoas na fase final da sua existência, sabendo que, para nós, crentes, a morte não é a última palavra!

No «Léxico» fala-se de «mediações legislativas»: quais são as consideradas aceitáveis?

Não existem “mediações aceitáveis” a priori. É certo que, nas questões fundamentais e delicadas sobre o fim da vida, é desejável que se chegue ao maior consenso comum possível e, por conseguinte, que as diferentes sensibilidades e crenças religiosas sejam tidas em conta de forma respeitadora. Esta é a tarefa da política. A Igreja pode colaborar, tendo em vista o bem comum de toda uma sociedade. A ela cabe a formação das consciências, mais do que a elaboração das leis.

Salvatore Cernuzio