· Cidade do Vaticano ·

A irmã Beatrice no Quénia

Deficiência não é inabilidade

 Deficiência não é inabilidade  POR-036
05 setembro 2024

As crianças com deficiência possuem um universo de potencialidades inexploradas e uma coragem extraordinária. A experiência da irmã Beatrice Jane Agutu numa escola do Quénia confirma que a deficiência não é inabilidade e que cada criança merece a possibilidade de brilhar.

«Como religiosas católicas, e especialmente como irmãs franciscanas de Santa Ana, somos chamadas a servir os mais vulneráveis. O nosso compromisso em aliviar o sofrimento e promover mudanças positivas continua a obrigar-nos a deixar que a nossa voz fale pelas numerosas pessoas vulneráveis que nos foram confiadas», disse a irmã Beatrice Jane, que gere a escola especial de São Martinho de Porres em Kisumu, no Quénia, ao serviço de mais de 300 crianças com várias deficiências. O seu testemunho não é apenas a narrativa de uma experiência, mas um convite à mudança de paradigma na oferta de cuidados, apoio e compaixão pelas pessoas vulneráveis.

O caminho da irmã Beatrice começou como professora em escolas normais. No entanto, uma vocação profundamente enraizada levou-a a explorar a educação especial, uma experiência que começou em 2003, quando foi chamada a trabalhar numa escola para surdos. «Apesar de não ter qualquer experiência prévia com a língua gestual», disse a Vatican News, «a minha determinação e compaixão impeliram-me». Hoje é uma comunicadora fluente com os surdos.

A irmã Beatrice é a confidente, guia, tutora e figura materna delas. O seu papel vai muito além da aquisição da língua. «Supervisiono uma comunidade de mais de 300 crianças com várias deficiências, como a paralisia cerebral, incapacidades físicas, desabilidades intelectuais e outras».

O percurso para entrar na sua escola não é fácil. Para que as crianças recebam um diagnóstico correto e um lugar adequado nas escolas, os pais devem navegar num complexo sistema de avaliações médicas e educacionais, antes que os seus filhos possam ser admitidos. «A nossa escola é um lar para estas crianças», explicou. «Muitas delas estão confinadas em casa, tratadas como pesos, invisíveis para o mundo; este isolamento agrava as vulnerabilidades das crianças e limita as suas oportunidades».

A escola serve como tábua de salvação para muitos, um lugar onde, dentro das suas paredes, as crianças encontram aceitação, liberdade, amizade, sentido de pertença, oportunidades para aprender e crescer e, o mais importante de tudo, amor. A firme convicção da irmã Beatrice no potencial dos seus alunos revelou-se contagiante. Ela não vê deficiências, mas habilidades inexploradas. A sua atitude positiva é uma prova da sua filosofia: «Deficiência não é inabilidade». Ela vê além dos seus desafios, reconhecendo o potencial que existe em cada criança.

«Gerir a escola é uma batalha constante e árdua», observou, indicando os imensos desafios que a sua escola deve enfrentar. O apoio inadequado do governo, a falta de recursos e as necessidades urgentes dos seus alunos são evidentes. Muitas vezes a sociedade considera estas crianças como um fardo, o que sobrecarrega a irmã Beatrice e o seu grupo.

Muitos pais não conseguem satisfazer as necessidades básicas, para não falar do custo dos cuidados e da educação especializada. Os pais, sobrecarregados com os desafios de criar uma criança com deficiência, recorrem frequentemente aos avós para receber apoio. «O governo», observou a irmã Beatrice, «oferece uma ajuda mínima, deixando que instituições como a nossa carreguem sozinhas o peso destes desafios». Até a sua congregação religiosa tem dificuldade em satisfazer as necessidades urgentes dos seus estudantes. No entanto, a irmã Beatrice e o seu grupo perseveram, proporcionando não só educação, mas inclusive cuidados essenciais, incluindo alimentação, vestuário e tratamentos médicos.

Talvez o desafio mais angustiante seja a indiferença da comunidade em geral. Em vez de oferecer apoio, a escola é muitas vezes vista como recurso a explorar. A escola e os seus alunos são convidados a contribuir para as atividades da Igreja, mas às vezes recebem pouca ajuda financeira. Numa entrevista a Vatican News, a senhora Claris Achieng Olare, mãe cujo filho sofre de paralisia cerebral, afirma que o estigma que sofrem como pais é que as pessoas pensam que os pais devem ter feito algo de errado e que esta é a consequência. Apela-se à sociedade para que aceite a existência destes casos, e o importante é prestar os cuidados e o apoio necessários a estas crianças sem preconceitos.

Apesar destes obstáculos, há momentos de triunfo extraordinário. Uma jovem, outrora incapaz de ler e escrever, tornou-se pregadora e fonte de inspiração para os seus coetâneos. «Estas histórias alimentam a minha paixão e impelem-me a continuar a cuidar destas crianças, a criar um mundo onde cada criança, independentemente das suas capacidades, seja valorizada e apoiada», declarou a irmã Beatrice, acrescentando: «Estas crianças devem ser celebradas, não compadecidas».

Concluindo, a religiosa exortou todos a cultivar os sonhos e o potencial das crianças com deficiência. «Une-te a nós», exortou, «na construção de um mundo onde a deficiência não seja uma inabilidade, mas um catalisador de resultados extraordinários».

Roselyne Wambani Wafula


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