As numerosas figuras que marcaram o desenvolvimento da Nação timorense

Uma história de heroísmo, fé e martírio

 Uma história  de heroísmo, fé e martírio  POR-038
19 setembro 2024

São muitos os sacerdotes, os consagrados, os missionários e os catequistas que deixaram a sua marca na história de Timor-Leste. Pessoas que deram um testemunho de vida evangélica que reverbera no presente. E são muitos os jovens que, inspirados pelas suas ações, ainda hoje escolhem por doar a vida a Cristo e ao próximo. Timor-Leste é uma terra florescente de vocações: basta olhar para os 300 jovens que celebram a Eucaristia com profunda participação no seminário maior de Díli, e os outros 300 que estudam no menor. Isto porque, durante os anos obscuros da opressão, no tempo da ocupação indonésia (1975-1999), foram precisamente «os sacerdotes, as religiosas, os catequistas que viveram ao lado da gente pobre, no sofrimento e na provação, levando consolo e o conforto da fé, doando a presença de Jesus que atravessava o deserto com todos eles», recordou à agência Fides o cardeal Virgílio do Carmo da Silva, arcebispo de Díli.

Como ele, muitos dos exponentes do clero viveram, desde jovens ou adolescentes, o tempo da resistência e usufruíram do exemplo de «homens e mulheres de Deus», dedicados ao serviço do próximo, autênticos «bons samaritanos» do Evangelho no tempo da opressão e da indigência.

Alguns, no período mais sangrento da guerra, foram vítimas das milícias indonésias, escrevendo «uma maravilhosa história de heroísmo, de fé, de martírio», como disse o Papa aos jovens do país na manhã de 11 de setembro. Basta recordar os sacerdotes timorenses mortos naquela conjuntura, como Tarcisius Dewanto, Hilario Madeira, Francisco Soares, Francisco Barreto, ou outros missionários que optaram por permanecer perto do povo, como o jesuíta alemão Karl Albrecht e as religiosas canossianas Erminia Cazzaniga, italiana, e Celeste de Carvalho Pinto, assassinados por bandos armados juntamente com dois seminaristas e um grupo de voluntários.

A figura do padre Alberto Ricardo da Silva (1943-2015), mais tarde nomeado bispo de Díli em 2004, ficou no coração do povo. No tempo da luta de resistência, procurou proteger muitos jovens, hospedando-os na sua paróquia de Santo António, em Motael. Era ele o pároco durante o famoso “massacre de Santa Cruz”, em novembro de 1991, quando o exército indonésio abriu fogo contra a multidão de jovens manifestantes, em frente ao cemitério. Aquele massacre de 200 jovens trouxe o caso de Timor-Leste à ribalta das crónicas internacionais e aquele sacrifício serviu para preparar a temporada do referendo que, em 1999, proclamou a independência.

O padre Alberto, recordam hoje os fiéis, «tinha a justiça e a paz no coração, procurava sempre cuidar da vida do seu rebanho, sobretudo dos jovens». Muitos representantes da Igreja timorense denunciaram as injustiças e pronunciaram-se abertamente pela liberdade, como Carlos Felipe Ximenes Belo, o bispo salesiano que em 1996 foi galardoado com o prémio Nobel da paz (sucessivamente acusado de violências, mesmo contra menores).

Não se pode esquecer do padre Martinho da Costa Lopes (1918-1991), vigário apostólico de Díli em 1977, que teve um papel crucial na história da resistência: encontrando-se com a então estrela em ascensão do movimento de resistência, o líder Xanana Gusmão (atual primeiro-ministro), o padre Martinho disse-lhe profeticamente que, para ter sucesso, o movimento de independência teria de abandonar a ideologia marxista. Aquela voz ecoou no coração de Gusmão, que a quis escutar: assim, em 1988 o movimento apresentou um documento político em que estipulava a renúncia explícita àquela ideologia. A única referência ideal, naquela luta não violenta, continuou a ser o Evangelho, e esta escolha de campo teve um impacto notável no prosseguimento da história do país, com efeitos ainda hoje visíveis.

Paolo Affatato