Em conversa com o frade capuchinho Roberto Pasolini novo pregador da Casa Pontifícia

Com a força da escuta

 Com a força da escuta  POR-046
14 novembro 2024

Frei Roberto Pasolini é arrebatado pela alegria e pelo receio perante a notícia da sua nomeação para pregador da Casa Pontifícia, e exprime o seu “mix” de emoções: «Por um lado, senti, como nalgumas passagens da vida, a alegria, o espanto perante algo de enormemente belo que se me deparava. No entanto, não escondo também, um certo receio perante uma tarefa muito grande que, embora corresponda um pouco à minha vocação de padre pregador, parece verdadeiramente enorme, pelo que me sinto um pouco atordoado, cheio de receio e de tremores, que não me impedem de confiar na força que o Senhor dá quando chama face a tais provas».

Uma grande prova também pelo peso de tal herança...

Para nós, frades capuchinhos, o padre Raniero Cantalamessa é, desde há muitos anos, como uma estrela que todos observamos e ouvimos sempre, com admiração pela sua capacidade teológica e comunicativa. Quando eu era um jovem frade estudante, ouvia as suas catequeses e as suas pregações na taberna com outros estudantes, comendo castanhas e bebendo vinho, e sentíamo-nos tão felizes por um de nós estar ali, no coração da Igreja, a anunciar o Evangelho, e nunca teria imaginado que um dia esta honra, esta honra, pudesse tocar a minha vida.

O Deus da Bíblia, que conhece bem, ensinando precisamente a exegese bíblica, é o Deus das surpresas, recorda-nos muitas vezes o Papa Francisco. Fortalecido pelos seus estudos que o levam a manusear uma matéria tão incandescente como a Sagrada Escritura, como se sente diante deste novo cargo?

A Palavra do Senhor foi para mim o grande meio através do qual o meu coração foi penetrado pela revelação de Deus. É daqui que parto no encaminhar-me em direção a este cargo: de ser um ouvinte que se deixou provocar pela Palavra de Deus e que a coloca quotidianamente no centro dos seus dias. Depois, sim, tenho sem dúvida uma bagagem de conhecimentos e estudos que me ajudarão, mas sinto que a maior força que me dá serenidade é ser ouvinte da Palavra de Deus e, portanto, que me é pedido o serviço mais conatural ao que sou e ao que me tornei ao longo do tempo.

Um pregador que é, antes de mais, um ouvinte. Uma atitude muito em linha com a dimensão da Igreja no sentido sinodal que o Papa tem vindo a pedir desde há anos.

Exatamente, sinto-me muito desafiado pelo tempo que vivemos, pelos passos que a Igreja está a dar neste tempo da história e com as suas dinâmicas de conversão interna como a da sinodalidade. Espero poder oferecer uma inteligência da Palavra de Deus que seja uma ajuda para cumprir o caminho corajoso e árduo que a Igreja é chamada a empreender para ser um sinal e um instrumento de salvação no mundo. A sinodalidade e, portanto, a comunhão e o diálogo, é uma mudança de registo muito forte que a Igreja está a viver: procurar ler os textos bíblicos e, portanto, oferecer meditações que aprofundem com inteligência nesta direção poderá iluminar-nos e ajudar-nos a dar estes passos.

Há poucos dias, o Papa doou outra encíclica à Igreja, a dedicada ao coração, ao Sagrado Coração de Jesus, Dilexit nos. Numa entrevista a Monica Mondo, na TV2000, falou do seu coração trespassado até às lágrimas ao ler o Evangelho de Mateus no metro, por isso pergunto-lhe: um texto como esta encíclica está talvez desatualizado hoje em dia, ou pelo contrário existe uma sabedoria ainda mais profunda que também nos pode ajudar a descobrir?

Por um lado, poderia parecer, exatamente, um texto que recorda a espiritualidade e devoções de outros tempos, por outro, considero-o muito profético, porque o tema do coração, mesmo na sua dimensão de sede dos nossos sentimentos, é um tema muito moderno, que também a teologia bíblica e espiritual precisa urgentemente de saber integrar na sua proposta de fé. No desenvolvimento do nosso caminho humano e, portanto, também como Igreja, é importante saber integrar bem a nossa parte emotiva. É claro que é preciso uma inteligência para saber ler dentro dos nossos sentimentos e para entrar numa relação cada vez mais cuidadosa entre nós e Deus, em que tudo o que somos é envolvido no seu chamamento e na missão que nos confia.

Sobre este tema das relações com o Pai e, portanto, entre nós, entre irmãos, recordo um artigo seu em «L’Osservatore Romano» em que falava, um ano depois da publicação de Fratelli tutti, de uma fraternidade a ser preservada porque, escrevia, as relações são frágeis e devem ser preservadas.

A fraternidade é a expetativa que Deus tem para a humanidade e para a Igreja. Mas sabemos que as relações fraternas são talvez a parte mais delicada da história humana, da vicissitude de cada um de nós. Isto é-nos também confirmado pelo contexto histórico em que vivemos, onde vemos como é difícil viver em paz e em comunhão entre nós, pelo que é de facto o maior desafio que temos, mas também o dom que, na realidade, já é em curso. Nós já somos, de facto, filhos de Deus, já somos irmãos entre nós, é uma questão de o preservar. Perante este dom, como, justamente, escrevia nesse artigo, devemos colocar-nos de forma muito humilde, como um destino ao qual não podemos renunciar, que está escrito e que já se está a desenvolver. A nossa responsabilidade é acompanhar este processo para que se torne cada vez mais autêntico e mais luminoso, a fim de se tornar aquele laço que apaga também as falsas divisões entre a Igreja e o mundo, e de apoiar todas as pessoas que procuram de boa vontade construir, cada um à sua maneira, o Reino de Deus na história e no tempo.

Andrea Monda